MP ajuíza Ação Civil Pública para suspender danos a comunidade exposta a agrotóxicos no Município de Abaré – BA.
O Ministério Público estadual, por meio da Promotora de Justiça Luciana Espinheira da Costa Khoury, titular da Promotoria Regional Ambiental de Paulo Afonso, ajuizou na última segunda-feira, dia 26 de abril, uma Ação Civil Pública em face de particular que realiza a pulverização terrestre de agrotóxicos no Distrito de Ibó 3, município de Abaré – BA.
Em fevereiro de 2020 moradores do Distrito de Ibó 3 procuraram a promotoria para denunciar que estavam sendo atingidos pela deriva de agrotóxicos pulverizados em uma propriedade rural vizinha às habitações. De acordo com os denunciantes, a população local tem sofrido diversas consequências negativas dos resíduos de agrotóxicos que afetam a população local, resultando em efeitos diretos no meio ambiente local e na saúde, causando nos moradores cansaço, alergias respiratórias, dores de cabeça, vômitos, dentre outros agravos.
Na oportunidade os moradores apresentaram um abaixo assinado contendo 228 assinaturas de moradores do Distrito Ibó 3, pedindo para que as pulverizações cessassem ou outras providências possíveis fossem adotadas. Informaram ainda que as pulverizações ocorriam a uma distância de cerca de 25 metros das primeiras casas do bairro e a cerca de 200 metros da escola Isabel da Silva Resende e a 250 metros da escola municipal São José.
Diante das denúncias apresentadas, o Ministério Público instaurou Inquérito Civil para apurar as possíveis irregularidades e os danos socioambientais da aplicação de agrotóxicos, que ocorre de forma terrestre com equipamentos (bombas costais) motorizadas. Na oportunidade o MP solicitou informações e diligências da Secretaria Municipal e Estadual de Saúde, da Agência de Defesa Agropecuária da Bahia (ADAB), da Prefeitura Municipal de Abaré, do Proprietário do empreendimento responsável pelas pulverizações, e da Secretaria Municipal de Meio Ambiente.
Considerando o conteúdo probatório, a Promotora de Justiça, Dra. Luciana Khoury, expediu recomendação solicitando que o proprietário se abstivesse de “praticar qualquer forma de pulverização de agrotóxicos, seja ela por via terrestre ou aérea, em áreas rurais inferiores a 1.000 (mil) metros do loteamento lbó 3.
Em dezembro de 2020, a Secretaria Municipal de Gestão Ambiental informou, através de relatório técnico, que a distância do local de aplicação dos agrotóxicos foi estendido para 40 metros das primeiras casas do bairro, mas que não havia sido possível identificar a forma como as aplicações de agrotóxicos eram feitas, nem os produtos utilizados, de modo que não era possível afirmar que as pulverizações não causavam danos aos moradores locais, mesmo com a nova distância adotada (40 metros), sendo necessárias mais informações técnicas especializadas.
Em janeiro desse ano, representantes do Distrito Ibó 3, voltaram a comunicar a Promotoria indicando que as pulverizações continuavam e que os danos e efeitos negativos decorrentes da deriva técnica de agrotóxicos e suportados pela comunidade continuavam a ocorrer, de modo que solicitavam a adoção de providências para preservar a qualidade ambiental local.
Assim, diante de inúmeras provas, tal como fotos e vídeos – os últimos do dia 29 de março de 2021 – evidenciando a ocorrência das pulverizações, inclusive por trabalhadores sem a utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI) e outros danos suportados pela comunidade local, o Parquet, visando garantir o equilíbrio ecológico, essencial à sadia qualidade de vida, conforme preceitua o art. 225 da Constituição Federal, ajuizou uma Ação Civil Pública em que pede a tutela jurisdicional para determinar que o particular se abstenha de realizar a pulverização de agrotóxicos e afins, por qualquer meio, em área inferior a 500 (quinhentos) metros das residências existentes no Distrito Ibó 3, e que forneça a todos os funcionários que trabalhem na aplicação de agrotóxicos os Equipamentos de Proteção Individual – EPI’s adequados, devendo ainda instruí-los e treiná-los para o uso, fiscalizar e exigir o uso correto, além de repor os equipamentos danificados, zelando pela saúde ocupacional dos trabalhadores em atenção à legislação ambiental e trabalhista em vigor.
“Tentamos, através de recomendação, suspender esses efeitos nocivos, mas não conseguimos acordo e por isso foi necessário ajuizar a ação civil pública. Os agrotóxicos causam danos ao ambiente, seja contaminando o solo, a água e o ar, além de contaminar o próprio trabalhador e muitas vezes aqueles que consomem os alimentos. Nesse caso, tivemos uma comunidade que está sendo afetada com agravos à saúde pela proximidade do uso do veneno” destacou a Promotora de Justiça e Coordenadora do Fórum Baiano de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, Transgênicos e Pela Agroecologia (FBCA), Dra. Luciana Khoury.
O que diz a lei sobre distâncias mínimas para a pulverização de agrotóxicos?
A Lei Federal de Agrotóxicos n.º 7.802/1989 não específica distâncias mínimas em relação a aplicação de agrotóxicos e a faixa de segurança a ser adotada para que habitações, corpos hídricos, animais, dentre outros, não sejam contaminados.
A pulverização aérea de agrotóxicos é a única que conta com uma regulamentação mínima contida na Instrução Normativa n. 2/2008 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). De acordo com a instrução normativa, a pulverização aérea de agrotóxicos é proibida em distâncias inferiores a 500 metros de vilas e povoados e de 250 metros de mananciais, e além disso, as aeronaves estão proibidas de sobrevoar áreas povoadas, moradias e agrupamentos, salvo para controle de vetores, carregando produtos químicos.
No caso da pulverização terrestre, seja ela mecanizada (tratores etc.) ou costal (manual ou motorizada) não existe nenhuma regulamentação federal de distâncias mínimas a serem obedecidas. Todavia, a inexistência de norma acerca da questão não significa que os agrotóxicos podem ser utilizados de qualquer modo e sem que sejam respeitadas distâncias que possam garantir o mínimo de segurança contra contaminações de pessoas e animais, afinal, disposições constitucionais que protegem o direito a saúde e ao próprio meio ambiente ecologicamente equilibrado justificam a adoção de medidas protetivas.
De acordo com a coordenadora do FBCA “Não existe na legislação especificação sobre distâncias mínimas para a pulverização terrestre de agrotóxicos nem de corpos hídricos, nem de fauna e de comunidades. É de fato necessário que exista essa regulamentação e, mesmo não havendo, não é possível permitir que exista a pulverização em prejuízo do ambiente e da saúde das pessoas. Os males causados à saúde são muitos, desde problemas respiratórios, náuseas, problemas de pele, distúrbios neurológicos, hormonais dentre outros, a depender do tipo de produto e da quantidade”.
Para Cleber Folgado, advogado e membro do FBCA “Existe uma lógica protetiva da saúde pública e do meio ambiente no sistema normativo regulatório de agrotóxicos, desse modo, ainda que não exista na legislação o estabelecimento de distâncias mínimas de faixas de proteção a serem adotadas na pulverização terrestre de agrotóxicos, torna-se juridicamente possível e necessário, por analogia, aplicar a regra acerca da pulverização aérea, estabelecendo-se assim distâncias mínimas de 500 metros de vilas e povoados e de 250 metros de mananciais e cursos d’água”.
Buscando contribuir no processo de regulamentação da questão, o FBCA vem construindo um texto base de propostas legislativa (Projeto de Lei) que será disponibilizado aos interessados visando a regulamentação de algumas questões referentes a temática dos agrotóxicos nos munícipios, estando contida na proposta o estabelecimento de faixas de segurança para a pulverização terrestre de agrotóxicos. Assim que a proposta estiver finalizada, um evento será realizado para que a proposta seja apresentada a parlamentares e lideranças sociais.
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