3ª Reunião Plenária do FBCA e a Conferência Livre de Meio Ambiente

No último dia 9 de dezembro aconteceu no auditório do Ministério Público do Trabalho da Bahia (MPT-BA) a 3ª Reunião Plenária do Fórum Baiano de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, Transgênicos e pela Agroecologia (FBCA). O evento foi marcado por debates sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde e no meio ambiente, incluindo palestras técnicas, avaliação de ações realizadas na 50ª Etapa da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) e a aprovação de novas entidades para o Fórum.

Palestra: “Conferência Agrotóxicos e Câncer”

A programação contou com a palestra “Conferência Agrotóxicos e Câncer”, ministrada por Márcia Sarpa, pesquisadora do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Durante a exposição, Márcia apresentou um panorama global e nacional do câncer, destacando mudanças de paradigmas em relação à prevenção e tratamento da doença.

“Os modelos tradicionais, focados no tratamento, em vez da prevenção, têm se mostrado insustentáveis a longo prazo, tanto em termos de saúde pública quanto nos custos econômicos e sociais”, afirmou a especialista. Ela ressaltou que o investimento em prevenção é fundamental para reduzir os casos de câncer e aliviar a sobrecarga dos sistemas de saúde.

A relação entre agrotóxicos e o desenvolvimento de câncer foi amplamente discutida na apresentação. Márcia destacou estudos científicos que associam essas substâncias a diferentes tipos de câncer, como:

  • Linfoma Não-Hodgkin (LNH): Pesquisas apontam que produtos como ácido diclorofenoxiacético (2,4-D), diazinona, glifosato e malationa estão associados ao aumento do risco de LNH. Essas substâncias possuem mecanismos de carcinogenicidade que podem desencadear a doença.
  • Câncer de Mama: Estudos sugerem que inseticidas organofosforados e o organoclorado heptacloro podem elevar o risco de câncer de mama, principalmente em populações expostas ocupacionalmente.
  • Câncer de Próstata: Há evidências de que os agrotóxicos aumentam o risco de câncer de próstata em até 1,17 vezes, colocando trabalhadores rurais em maior vulnerabilidade.

Além disso, Márcia explicou que muitos agrotóxicos funcionam como disruptores endócrinos, interferindo na regulação hormonal e contribuindo para a carcinogênese, sendo um fator de grande preocupação para a sociedade, pois a população tem adoecido.

Atuação do FBCA na 50ª Etapa da FPI – Região de Guanambi

A reunião também avaliou as ações realizadas pelo FBCA durante a 50ª Etapa da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI), ocorrida na região de Guanambi, no período de 13 a 26 de outubro de 2024 e contou com duas equipes voltadas ao combate aos impactos dos agrotóxicos.

Equipe 01 – Educação e Monitoramento

Composta por representantes do FBCA (GERMEN, DIVISA, UFBA, INEMA, MP e colaboradores) a equipe realizou palestras em escolas, câmaras de vereadores e emissoras de rádio para conscientizar a população sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde pública, no meio ambiente e na agricultura. Além disso, a equipe promoveu formação acerca de alternativas agroecológicas, demonstrando as ações práticas que permitem uma produção sem agrotóxicos.

Outras ações incluíram:

  • Monitoramento do VSPEA: Avaliação da implementação da Vigilância em Saúde de Populações Expostas a Agrotóxicos e capacitação de equipes de saúde para notificação de intoxicações.
  • Acompanhamento da morte de abelhas por agrotóxicos: Análise das causas da mortalidade de abelhas na região, essencial para a preservação dos serviços ecossistêmicos, que vem sendo afetadas por agrotóxicos.
  • Monitoramento de água e alimentos: Coleta de 12 amostras de água e 42 de alimentos para análise laboratorial, visando identificar a presença de resíduos de agrotóxicos em produtos consumidos pela população. Essa atuação foi pioneira de grande importância para a região, envolveu as Vigilâncias Sanitárias municipais e a DIVISA. Os resultados serão detalhados e apresentados  na próxima Plenária do FBCA.

Equipe 02 – Fiscalização em Campo

A segunda equipe, composta por representantes da ADAB, CIPPA, FBCA, CREA e MP-BA, realizou inspeções em revendas de agrotóxicos e identificou diversas irregularidades, tais como:

  • Depósitos inadequados: Falta de ventilação, organização, sinalização e materiais de contenção em caso de acidentes.
  • Exposição de produtos: Colocação de agrotóxicos em prateleiras de forma irregular.
  • Falta de segurança: Manipulação de agrotóxicos sem o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).
  • Comercialização de produtos clandestinos: Venda de substâncias não autorizadas ou vencidas, incluindo “chumbinho” e agrotóxicos fracionados para fins comerciais, como o metomil. Foi motivo de grande preocupação a existência de produtos circulando para a venda em mercados, revendas de agrotóxicos, e outros locais, sendo caracterizado como um produto clandestino não registrado no MAPA e nem na ANVISA. O produto era usado para insetos, mas também para a lavoura. Houve apreensão dos produtos localizados. Chamado de Pingo Fatal, Gota Letal, Pingo Letal.

Houve duas prisões diante da gravidade dos fatos de produtos clandestinos, fracionamentos e vendas em garrafas de refrigerante,

Durante as operações, foram retirados de circulação 250 litros e 40 kg de agrotóxicos vencidos ou armazenados de forma irregular, além de produtos domissanitários vendidos sem autorização dos órgãos competentes.

Conferência Livre de Meio Ambiente: Agrotóxicos, Alimento e Água x Clima

Ainda na tarde do dia 9 de dezembro de 2024, o auditório do Ministério Público do Trabalho da Bahia (MPT-BA) foi palco da Conferência Livre de Meio Ambiente, um evento que trouxe à tona discussões fundamentais sobre os impactos dos agrotóxicos e das mudanças climáticas no meio ambiente, na saúde e na segurança alimentar.

Palestra: Agrotóxicos e Mudanças do Clima

A primeira palestra, intitulada “Agrotóxicos e mudanças do clima”, foi ministrada por Karen Friederich. A apresentação destacou como os agrotóxicos e as mudanças climáticas formam um ciclo de impactos negativos, amplificando danos ao meio ambiente, prejudicando a saúde humana e comprometendo a segurança alimentar. Há a necessidade de adotar práticas agrícolas sustentáveis e políticas públicas que reduzam o uso de agrotóxicos e promovam a resiliência climática como medidas essenciais para enfrentar os desafios globais.

Palestra: Agroecologia como Enfrentamento à Emergência Climática

Na sequência, as professoras Felizarda Bebé e Flávia Barbosa, que são integrantes do FBCA ministraram palestra “Agroecologia como enfrentamento à emergência climática”. As especialistas reforçaram como a agroecologia se apresenta como uma alternativa viável e sustentável para mitigar os impactos das mudanças climáticas.

A abordagem agroecológica foi detalhada com base em práticas como:

  • Diversificação de cultivos: Sistemas agrícolas diversificados reduzem os riscos de perdas por eventos climáticos extremos, como secas ou inundações.
  • Conservação do solo: O uso de técnicas como cobertura vegetal e compostagem protege o solo contra a erosão, aumenta sua capacidade de retenção de água e captura carbono.
  • Preservação da biodiversidade: A integração de diferentes culturas, árvores e animais fortalece os ecossistemas, tornando-os menos vulneráveis a pragas e doenças que se intensificam com as mudanças climáticas.

Debates e Propostas para a Conferência Nacional

A Conferência Livre foi também um espaço para a construção de propostas a serem levadas para a etapa nacional, com base em cinco eixos temáticos:

  1. Mitigação
  2. Adaptação e preparação para desastres
  3. Justiça Climática
  4. Transformação Ecológica
  5. Governança e Educação Ambiental

Entre as propostas apresentadas, destacam-se:

  • Eixo I – Mitigação:
    • Instituir o licenciamento ambiental para atividades agrossilvopastoris.
  • Eixo II – Adaptação e preparação para desastres:
    • Implementar o PRONARA (Programa Nacional para Redução do Uso de Agrotóxicos).
    • Criar políticas municipais que exijam a instalação de postos de recebimento de embalagens de agrotóxicos, com infraestrutura licenciada e em locais seguros para evitar acidentes climáticos.
  • Eixo III – Justiça Climática:
    • Inserir a disciplina “Impacto socioambiental do uso de agrotóxicos e transgênicos” em cursos superiores nas áreas de agricultura, saúde e meio ambiente.
  • Eixo IV – Transformação Ecológica:
    • Promover práticas de sustentabilidade rural e direcionar subsídios econômicos para projetos de educação ambiental, focando na redução do uso de agrotóxicos e na implementação da agroecologia.
  • Eixo V – Governança e Educação Ambiental:
    • Implantar sistemas de controle de receituários agronômicos, com registros detalhados sobre a venda, aplicação e responsabilidade técnica no uso de agrotóxicos.
    • Financiamento de políticas públicas de formação em agroecologia, com foco em pequenos agricultores, povos indígenas e comunidades quilombolas.

Escolha dos Delegados para a Conferência Nacional

Encerrando a Conferência, foi realizada a votação para escolha dos delegados que representarão o evento na Conferência Nacional de Meio Ambiente. Por unanimidade, foram eleitos o Coordenador Adjunto do FBCA, Cláudio Mascarenhas, e o professor Ruy Muricy.

A Conferência Livre consolidou-se como um espaço de diálogo e construção coletiva, reforçando a importância de soluções que alinhem sustentabilidade, justiça climática e fortalecimento da agroecologia como pilares para enfrentar os desafios climáticos e promover uma agricultura mais saudável e sustentável.